domingo, novembro 24, 2013

Acto de consagração do género humano a Cristo Rei

Com a Encíclica Quas primas, de 11 de Dezembro de 1925, o Papa Pio XI, sete anos após o fim da Grande Guerra e catorze anos antes da Segunda Guerra Mundial, instituiu a Festa de Cristo Rei.


H. Memling, Cristo rodeado por anjos músicos (porm.) (1480-81)

Escreveu Pio XI:
"Em virtude de Nossa autoridade apostólica, instituímos a festa de «Nosso Senhor Jesus Cristo Rei», mandando que seja celebrada cada ano, no mundo inteiro, no último domingo de Outubro, isto é, no domingo imediatamente anterior à Solenidade de Todos os Santos. Prescrevemos igualmente que, cada ano, se renove, nesse dia, a consagração do género humano ao Coração de Jesus, que já o Nosso Predecessor de saudosa memória S. Pio X ordenara se fizesse anualmente" (n. 30).
O último Domingo de Outubro, como data da Solenidade, permanece para o Calendário da Forma Extraordinária do Rito Romano. Com a reforma pós-conciliar, a Solenidade passou para o 34º Domingo do Tempo Comum, ou seja, o último Domingo do Ano Litúrgico, portanto, o domingo imediatamente anterior ao I Domingo do Advento.
O Enchiridion Indulgentiarum (Manual das Indulgências) apresenta este citado Acto de Consagração do género humano a Jesus Cristo Rei como oração enriquecida com indulgência plenária.
Em comunhão e em obediência a estes dois grandes Papas, rezemo-lo neste Domingo:
Ó dulcíssimo Jesus, Redentor do género humano, lançai sobre nós, humildemente prostrados na Vossa presença, o Vosso olhar. Nós somos e queremos ser Vossos. E a fim de podermos viver mais intimamente unidos a Vós, cada um de nós se consagra, espontaneamente, neste dia, ao Vosso Sacratíssimo Coração.
Muitos há que nunca Vos conheceram; muitos, desprezando os Vossos mandamentos, Vos renegaram. Benigníssimo Jesus, tende piedade de uns e de outros e trazei-os todos ao Vosso Sagrado Coração.
Senhor, sede Rei não somente dos fiéis que nunca de Vós se afastaram, mas também dos filhos pródigos que Vos abandonaram; fazei que estes retornem quanto antes à casa paterna, para não perecerem de miséria e de fome.
Sede Rei dos que vivem iludidos no erro ou separados de Vós pela discórdia; trazei-os ao porto da verdade e à unidade da fé, a fim de que em breve haja um só rebanho e um só Pastor.
Senhor, conservai incólume a Vossa Igreja e dai-lhe uma liberdade segura e sem peias; concedei ordem e paz a todos os povos; fazei que de um pólo a outro do mundo ressoe uma só voz: louvado seja o Coração divino que nos trouxe a salvação, honra e glória a Ele por todos os séculos.
Amen.

domingo, novembro 10, 2013

No Céu não existe o casamento. Mas na Terra sim...

Um dia, procurando embaraçar Jesus, os saduceus inventaram uma história muito complicada, que Jesus esclareceu com a sua divina sabedoria (Lucas 20, 27-38), mas o princípio legal a que se referem, a “lei do levirato” (cf. Deuteronómio 25, 5-6), tem pelo menos uma aplicação muito feliz na Sagrada Escritura.
É a encantadora história que lemos no livro de Rute: um rico proprietário hebreu, chamado Booz, desposa Rute, a moabita, para dar descendência ao sogro desta, seu parente.
Julius Schnorr von Carrosfeld, Rute e Booz (1825)

Recordemos como tudo aconteceu. Houve um casal de Belém, que, num tempo de grande carestia e de fome, emigrou para um país vizinho, as “terras de Moab” (uma região montanhosa no que é actualmente a Jordânia). O marido chamava-se Elimelec e a mulher Noemi. Foram com os seus dois filhos, Maalom e Quiliom, que entretanto se casaram com mulheres moabitas, Orpa e Rute.
Mas sobreveio a desgraça a esta família; primeiro morre o pai e depois morrem os dois filhos. As três mulheres ficam viúvas e sem filhos, não havendo descendência para Elimelec.
Entretanto, Noemi soube que Deus tinha voltado a olhar para Israel, dando pão ao seu povo, e decide retornar à sua terra natal, Judá. As noras põem-se a caminho com ela. Mas Noemi insiste em que fiquem em Moab, pedindo a benevolência de Deus para dar a cada uma um marido de entre os homens do seu povo. De facto, Orpa volta “ao seu povo e aos seus deuses”, mas Rute, sincera e firme na sua fé no único Deus verdadeiro, fica com Noemi, e com ela entra em Belém.  
Aqui, como não tinha outro trabalho, para se sustentar a si mesma e à sogra, Rute vai respigar nos campos de cevada atrás dos ceifeiros, conquistando, com os seus encantos e as suas virtudes, a afeição de Booz, rico proprietário, parente do seu sogro.
Por conselho da sogra, que pensa em casá-la com Booz, Rute passa uma noite junto deste, na eira da sua propriedade, e aproveita a ocasião para lhe recordar o dever de suscitar descendência ao seu falecido parente, Elimelec, tomando-a como esposa (uma vez que Noemi já tinha passado a idade de ter filhos).
O convite de Rute agrada a Booz, mas há outro parente com direito de precedência. Superado o obstáculo pela desistência deste parente, Booz desposa Rute, e esta dá-lhe um filho, chamado Obed, que será pai de Isaí (Jessé), o qual, por sua vez, será pai do grande rei David, de cuja descendência, segundo a lei, através de S. José, nasceu o Messias prometido, o próprio Jesus, Filho de Deus feito homem.

É principalmente por estas duas razões que o casamento é tão importante na sociedade: pela união do casal e pelo dom dos filhos que poderão ser gerados nessa união.
É verdade que há casais que (já) têm filhos e (ainda) não são casados. Trata-se de uma situação imperfeita, a vários títulos, que, quase todos, mais cedo ou mais tarde, procuram resolver. Se são cristãos e não estão casados, não são sinal da união de Cristo com a Igreja. Se só «vivem juntos», estão em pecado, não podem comungar nem se podem confessar. E, se não são cristãos, falta-lhes o sinal do compromisso, que, mesmo sendo imperfeito, é importante para a sociedade a que pertencem.
O homem e a mulher, a partir da sua união como casal, em que se dão totalmente um ao outro, podem ser pais, gerar novas vidas de seres humanos, chamados a serem filhos de Deus e a irem para o Céu um dia.
E estas duas dimensões, mesmo quando a segunda, contra a vontade do casal, não se vem a realizar, dão ao casamento a sua extraordinária importância na sociedade e na Igreja.

Como ensina Jesus, no Céu não existe o casamento (Lucas 20, 35-36), porque já não há morte, não é preciso gerar novas vidas, viveremos todos como irmãos e irmãs, na imensa felicidade de contemplar a glória de Deus.
Mas na Terra, sim, existe o casamento, que é compromisso e aliança do homem e da mulher, aberto ao dom dos filhos, que trazem sempre nova esperança a este mundo.
Também já hoje alguns homens e mulheres são chamados por Deus a uma entrega total, e por isso renunciam ao casamento; e outros, por circunstâncias diversas da vida, também não se casam, e abraçam essa condição com sentido sobrenatural.
Os que são chamados ao casamento podem chegar lá por muitos caminhos e no termo de muitas e variadas etapas, algumas cheias de acidentes, mas está provado que as melhores são as seguintes: pureza e castidade no namoro; busca de uma total sintonia interior; diálogo sincero e contínuo; fidelidade absoluta, que prepara o compromisso definitivo; oração pessoal intensa; comunhão e confissão frequentes.

E quanto ao dom dos filhos, e ao exercício da “paternidade responsável” (segundo a expressão de Paulo VI na encíclica Humanae Vitae habitualmente referido como “planeamento familiar”, verifica-se que são poucos os católicos que conhecem o que a Igreja propõe.
A Igreja Católica, apesar das grandes pressões em sentido contrário, defende o uso dos métodos naturais para o planeamento familiar.
Numa entrevista à Rádio Renascença, disse uma especialista, Mary Anne d’Avillez
"A grande maioria tem uma vaga ideia que é tudo proibido. Não conhece ou não sabe que existem métodos de regulação natural dos nascimentos que são extremamente fiáveis e reconhecidos pela Organização Mundial de Saúde”[1].
A Igreja mantém a convicção de que este é o caminho melhor para os casais e para as famílias:
“A continência periódica, os métodos de regulação dos nascimentos baseados na auto-observação e no recurso aos períodos infecundos, são conformes aos critérios objectivos da moralidade. Estes métodos respeitam o corpo dos esposos, estimulam a ternura entre eles e favorecem a educação duma liberdade autêntica. Em contrapartida, é intrinsecamente má «qualquer acção que, quer em previsão do acto conjugal, quer durante a sua realização, quer no desenrolar das suas consequências naturais, se proponha, como fim ou como meio, tornar impossível a procriação»” (Catecismo da Igreja Católica, n. 2370).
O planeamento familiar é uma das áreas que o documento preparatório do Sínodo sobre a Família propõe reflectir. O ponto 7 do inquérito pergunta se os cristãos conhecem a encíclica Humanae Vitae sobre a regulação da natalidade, se aceitam a doutrina moral que aí é proposta e que informação lhes é transmitida pela própria Igreja.
Nos Cursos de Noivos de Santa Maria de Belém, os casais que expõem este tema, dão testemunho do modo como vivem esta realidade, e da enorme graça que estes métodos podem representar na vida de um casal.
Por isso, só posso corroborar a expectativa confiante de Mary Anne d'Avillez que, “espera que a Igreja portuguesa saiba aproveitar a oportunidade deste inquérito para mudar alguns procedimentos. Por exemplo, incluir o tema do planeamento familiar e dos métodos naturais de controlo da fertilidade nos cursos de preparação para o matrimónio”.



[1] Os principais são o método sintotérmico e o método Billings, que estudos recentes na China e na Alemanha comprovaram ter uma eficácia superior a 99%. "Mais do que a pílula", nota Mary Anne d'Avillez..