domingo, junho 02, 2013

O admirável Sacramento


Com a sóbria linguagem da Liturgia, a Oração Colecta da Missa da Festa do Corpo de Deus refere-se à Santíssima Eucaristia, como “admirável sacramento”:
Senhor Jesus Cristo, que neste admirável sacramento
nos deixastes o memorial da vossa paixão,
concedei-nos a graça
de venerar de tal modo os mistérios do vosso Corpo e Sangue
que sintamos continuamente os frutos da vossa redenção.
Vós que sois Deus com o Pai na unidade do Espírito Santo.
Ou, na versão latina:
Deus, qui nobis, sub Sacraménto mirábili, passiónis tuæ memóriam reliquísti: tríbue, quæsumus; ita nos Córporis et Sánguinis tui sacra mystéria venerári, ut redemptiónis tuæ fructum in nobis júgiter sentiámus: Qui vivis et regnas cum Deo Patre in unitáte Spíritus Sancti Deus, per ómnia sæcula sæculórum.
Com esta mesma expressão começou Bento XVI a sua Exortação Apostólica Sacramentum caritatis (Sacramento da Caridade) (de 22 de Fevereiro de 2007): 
“Sacramento da Caridade, a Santíssima Eucaristia é a doação que Jesus Cristo faz de Si mesmo, revelando-nos o amor infinito de Deus por cada homem. Neste admirável sacramento, manifesta-se o amor «maior»: o amor que leva a «dar a vida pelos amigos» (João 15, 13). De facto, Jesus «amou-os até ao fim» (João 13, 1). Com estas palavras, o evangelista introduz o gesto de infinita humildade que Ele realizou: na vigília da sua morte por nós na cruz, pôs uma toalha à cintura e lavou os pés aos seus discípulos. Do mesmo modo, no sacramento eucarístico, Jesus continua a amar-nos «até ao fim», até ao dom do seu corpo e do seu sangue. Que enlevo se deve ter apoderado do coração dos discípulos à vista dos gestos e palavras do Senhor durante aquela Ceia! Que maravilha deve suscitar, também no nosso coração, o mistério eucarístico!” (n. 1).
“Admirável Sacramento”. E porquê “admirável”, porquê tão especialmente “admirável”?
Porque na Santíssima Eucaristia se contém o “memorial” da Paixão de Cristo.
Memorial é mais que memória. É memória e actualização. S. Paulo, na 1ª Carta aos Coríntios, depois de descrever a instituição da Eucaristia na Última Ceia, sublinha especialmente esta ordem do Senhor: “Fazei isto em memória de Mim” (1 Coríntios 11, 24).
E se não tivesse sido uma ordem expressa de Jesus Cristo, seria sempre uma necessidade premente da sua Igreja fazer memória, que não é apenas lembrar, mas, muito mais do que isso, tornar presente, em cada domingo, em cada dia, aquele sofrimento que nos salvou, aquela morte que nos trouxe a vida e a ressurreição.
O Papa Francisco celebra a Missa do Corpus Christi no átrio da Basílica de S. João de Latrão  (30.05.2013)

Na Eucaristia, a Paixão de Cristo, com o seu incomparável caudal de dor e de amor, está presente, e como que desce sobre o mundo, de modo semelhante ao sol da manhã que dissipa as trevas, como que abraça e envolve o mundo intimamente, para o curar e salvar.
A Eucaristia é o sacrifício de Cristo, em si mesmo irrepetível, mas incessantemente representado, isto é, tornado presente, na memória viva da sua Igreja.
Celebrar a Eucaristia não é voltar a contar uma história que já outros nos contaram. É voltar a tornar presente no hoje da história um acontecimento que abraça a história por dentro e diz respeito a cada homem.
É preciso amar e ensinar a amar a Eucaristia.
O Papa Bento XVI, na mesma Exortação Apostólica Sacramentum caritatis , disse expressamente que é necessário ensinar as crianças a amar a Eucaristia, é necessário “iniciá-las no sentido e na beleza de demorar-se na companhia de Jesus, cultivando o enlevo pela sua presença na Eucaristia” (n. 67).
Possivelmente nas últimas décadas a catequese, a pregação e a própria Liturgia celebrada não terão muitas vezes ensinado a amar a Eucaristia. 
Mas só com a consciência explícita do mistério celebrado e com a própria beleza da Liturgia podemos ensinar a amar a Eucaristia. Sem isso, não se ama, porque não se chega a conhecê-la nem a vivê-la na sua verdade e beleza.
O dia do “Corpo de Deus” é um dia dedicado à serena contemplação do mistério da Eucaristia. Em muitos locais o Santíssimo Sacramento sai às ruas, levado solenemente em procissão.
O Papa Francisco dá a bênção com o Santíssimo Sacramento no final da procissão do Corpus Christi 
Este olhar contemplativo é possível, porque na Eucaristia está Cristo vivo, escondido sob as espécies do pão e do vinho.
O memorial, embora tornando presente a Paixão do Senhor, traz-nos Cristo, não como Ele foi, sujeito à dor e morte, mas como Ele é, vencedor da morte e gloriosamente ressuscitado. Por ser Memorial e não memória, a Eucaristia dá-nos o mesmo Jesus dá-nos o mesmo Cristo que passou pela morte e que dela Se levantou, ressuscitado, e que reina com o Pai e o Espírito Santo pelos séculos dos séculos.
E porque a Eucaristia nos dá Jesus, podemos pedir-Lhe, como faz a Liturgia, na Oração sobre as Oblatas, que dê à sua Igreja o dom da unidade e da paz, esse dom que as oferendas colocadas no altar misticamente simbolizam.
E por fim pedir-Lhe-emos também a participação eterna da sua divindade, que é prefigurada na comunhão do seu precioso Sangue.
Que esta Comunhão nos alimente e purifique, para que um dia, quando os sinais sacramentais já não forem necessários, quando até a Eucaristia já não precisar de ser celebrada nos nossos altares, contemplemos a própria realidade que eles representam, isto é, o próprio o próprio Cristo, na glória do Pai, a quem hoje, continuando ainda a ser peregrinos e caminhantes, queremos amar, seguir, adorar e anunciar.

1 comentário:

  1. Felecitar pelo fato de D. Manuel Clemente estar presente no Mosteiro de Jerónimos no próximo dia sete de Julho.
    Fiquei muito contente por estas boas vindas.
    Parabéns, Padre José Manuel Ferreira.
    Cordialmente,
    Célia Fonseca

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